EXPERIÊNCIA DE CONSTITUIÇÃO DO PROJETO DE EXTENSÃO RURAL AGROECOLÓGICA REMA-ZM
Autor/es:
» Natália Barbosa Rodrigues
» Mathias Moraes Abrão
» Juliana de Vasconcelos Shimada Brotto
» Letícia Carvalho Passos
» Clarice Santana da Silva
» Alex Xavier Pinheiro
» Diogo Nogara Nunes
Descripción:
Responsáveis pelo projeto: Profª. Drª. Maria Alice Fernandes Corrêa Mendonça, estudante Clarice Santana da Silva.
Email: remazonadamata@gmail.com
Número para contato: +55(31)99443-0692
Instagram: @remazonadamata
Universidade Federal de Viçosa – Departamento de Economia Rural.
Equipe do projeto:
Estagiários: Clarice Santana da Silva, Alex Xavier Pinheiro, Diogo Nogara Nunes, Juliana de Vasconcelos Shimada Brotto, Letícia Carvalho Passos, Mathias Moraes Abrão, Natália Barbosa Rodrigues.
A Zona da Mata Mineira (ZM) é uma mesorregião composta por um total de 143 municípios, localizada no sudeste do estado de Minas Gerais, cujo bioma predominante é a Mata Atlântica, caracterizada pelo domínio morfoclimático dos Mares de Morros, extremamente declivoso (Rodrigues, 2019). As atividades agrícolas mais frequentes são as lavouras de café nas partes mais altas e as pastagens para gado (Rodrigues, 2019). Na ZM, 53,75% dos estabelecimentos rurais totais possuem 10 hectares ou menos, segundo dados do Censo Agropecuário de 2017 (IBGE, 2017). Segundo estes dados, destas propriedades, 75,52% pertencem a agricultores familiares, caracterizando o tipo de perfil majoritário da ocupação fundiária da região.
O movimento agroecológico na ZM remete à década de 1980, junto à fundação do Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata Mineira (CTA-ZM), em Viçosa, no encontro com as diversas organizações da agricultura familiar na região atualmente localizada nas mediações do Parque Estadual da Serra do Brigadeiro. Num primeiro momento, o movimento agroecológico buscava dinamizar a pesquisa e a atividade extensionista na área, voltada à agricultura alternativa, em contraposição ao pacote da revolução verde, atuando em conjunto com a Universidade Federal de Viçosa (UFV) (Cardoso & Ferrari, 2006). Desde então, essa articulação CTA/UFV junto às organizações da agricultura familiar, tem colaborado para a constituição de uma diversidade de ações, grupos e iniciativas da agroecologia na ZM. Hoje, essa região é reconhecida pela Lei Estadual nº 23.207/18 (Minas Gerais, 2018) como Polo Agroecológico e de Produção Orgânica.
A agroecologia caracteriza-se como ciência, prática e movimento social, contribuindo para redesenhar sistemas agroalimentares sustentáveis (Wezel et al., 2009; Gliessman, 2016) em diálogo com as experiências e conhecimentos territorializados. O diálogo de saberes, científico e popular, tal como definido por Freire (1983), surge como pilar fundamental da proposta agroecológica, traçando um contraponto às abordagens difusionistas usualmente empregadas na região pelo projeto modernizante da agricultura. Na UFV, o Núcleo de Agroecologia e Educação do Campo (ECOA) torna-se um dos catalizadores dessa perspectiva (Cardoso et al. 2021 ).
Junto ao ECOA, atualmente, estão a Rede Raízes da Mata (RRM), uma organização de agricultores e agricultoras familiares, processadores e prosumidores agroecológicos criada em 2011 (Cruz et al., 2013), o grupo de extensão da Rede de Mutirões Agroecológicos da Zona da Mata Mineira (REMA-ZM), o Mutirão Ciranda e diversos outros coletivos. A REMA-ZM surgiu informalmente no ano de 2018, a partir da iniciativa de um grupo de estudantes do curso de agronomia que se reuniu para realizar atividades diárias nas propriedades de alguns agricultores e agricultoras da RRM. No início de 2019 o grupo foi formalizado como um projeto de extensão, possibilitando o registro oficial dos estagiários e a participação em editais e eventos.
A REMA visa ser um espaço de diálogo e aprendizagem entre os conhecimentos científicos e populares, utilizando a metodologia de mutirões baseada na pedagogia Campesino-a-Campesino. Como definido por Holt-Giménez (2006) e Machín-Sosa et al. (2012), nessa abordagem, a convivência direta entre agricultores e agricultoras cria um espaço de aprendizagem através do trabalho prático, na qual técnicas e técnicos são facilitadores do diálogo de saberes.
Para os agricultores da RRM, a colaboração com o trabalho na agricultura constitui uma complementação da mão de obra, além da experiência de troca e aprendizagem diária com esses estudantes, que respeitam e valorizam os saberes camponeses. Para as/os estudantes do curso de agronomia, este trabalho possibilita a vivência da extensão rural com a agricultura familiar camponesa. Nesse contexto, a REMA surge como uma experiência de troca e aprendizagem mútuas, as quais fortalecem a agroecologia e contribuem para a sistematização das experiências na Zona da Mata.
Inicialmente o grupo contava com um número reduzido de estagiários voluntários, que se deslocavam por conta própria até as propriedades de 4 agricultores parceiros da RRM, já praticantes da agricultura agroecológica. Posteriormente, com o registro oficial do projeto na UFV, o número de estagiários pôde ser aumentado consideravelmente, assim como a quantidade de propriedades atendidas, chegando a totalizar 6 localidades. As visitas aos agricultores ocorriam semanalmente , e nelas os estagiários têm a oportunidade de auxiliar na manutenção e no manejo da área, trazendo para a universidade as dúvidas encontradas durante a vivência a fim de discutir com os outros integrantes da REMA-ZM durante as reuniões quinzenais, assim como também desenvolver iniciativas próprias em conjunto com as famílias.
Durante a consolidação do projeto alguns agroecossistemas apresentaram-se como mais sensíveis, a exemplo da avaliação das frequências dos estagiários, especialmente dos membros mais novos. Para evitar que ocorresse uma perda do foco do grupo e da credibilidade do projeto com os agricultores, foram adotadas medidas para melhorar o acompanhamento dos estudantes, através de sistemas de relatórios semanais do trabalho de cada um, objetivando o cumprimento da frequência preestabelecida de 75% por mês e a verificação do desempenho de diferentes atividades nas propriedades. Além disso, foi organizada uma rotação de estudantes nas propriedades baseada no trabalho em duplas, nas quais um membro mais novo trabalhava em conjunto com um membro mais velho, facilitando a aclimatação aos métodos de trabalho e às famílias participantes. Outro ponto sensível foi a falta de recursos no início do processo de implementação do projeto, fazendo com que os estagiários tivessem que arcar com as suas próprias despesas de transporte às casas das famílias. Essa situação foi sanada em 2019 através da gratificação concedida pelo edital FUNARBEX (Programa da Fundação Artur Bernardes de Apoio à Extensão).
Devido à conjuntura da pandemia, as ações presenciais foram suspensas desde 2020, o que levou a uma redução de pessoal no grupo e a uma alteração no tipo de atividades desenvolvidas. Teve início, assim, o projeto de confecção de uma série de cartilhas informativas sobre os processos burocráticos da produção orgânica, previstos na legislação orgânica brasileira, em colaboração com o projeto de consolidação do Sistema Participativo de Garantia Orgânica e Polo de Desenvolvimento Agroecológico da Zona da Mata Mineira, determinado pela Lei Estadual nº 23.207/18 (Minas Gerais, 2018). Atualmente, já foi realizada a produção e distribuição da primeira cartilha, sobre a transição orgânica, e existem mais outras duas cartilhas em processo de produção, que tratam da documentação necessária para a certificação orgânica e plano de manejo e da produção orgânica de mudas e sementes. Além disso, foi implementado o trabalho remoto com os agricultores como atividade complementar, através do auxílio no preenchimento dos Cadernos de Plano de Manejo Orgânico e na colaboração do processo de constituição do Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade Orgânica (OPAC) do SPG da Zona da Mata Mineira, responsável por garantir a qualidade dos produtos e gerir a organização do sistema.
Pode-se concluir que, após o período de 3 anos de existência do grupo, foi possível constituir um núcleo de estudantes sólido, engajado e participativo, que consegue desenvolver iniciativas e tomar decisões de forma descentralizada, com metodologias de trabalho bem definidas. O impacto social avaliado com base nos feedbacks das famílias participantes foi significativo, demonstrando a capacidade e viabilidade da aplicação de projetos dessa natureza em diferentes realidades e escalas, sem a necessidade de um alto investimento de recursos ou de uma estrutura muito complexa. A REMA soma e contribui com a rede sociotécnica e movimento agroecológico a partir de uma experiência extensionista universitária, fortalecendo a integração entre ensino e aprendizagem a partir da realidade situada e dos saberes territorializados.
Referências:
Cardoso et al. Educação do Campo e Agroecologia Ecoam na Zona da Mata. (2021). IN: Haliski, A. et al. Saber e Fazer Agroecológico. Curitiba: CRV. 186p.
Cardoso, I. M., Ferrari, E. A (2016). Construindo o conhecimento agroecológico: trajetória de interação entre ONG, universidade e organizações de agricultores. Agriculturas, 3 (4), 28–31. http://aspta.org.br/files/2019/11/Artigo-6-6.pdf
Cruz, N. A. C., Zanelli, F. V., Borges, K. S., Ladeira, I. F. S., Barreto, E. M. A., Cardoso, I. M. (2013). Rede Raízes Da Mata: Relocalizando a Agricultura Familiar Camponesa Na Zona Da Mata Mineira. Cadernos de Agroecologia, 8(2). http://revistas.aba-agroecologia.org.br/index.php/cad/article/view/14114
Freire, Paulo. (1983). Extensão ou Comunicação?. 8ª. Ed., Rio de Janeiro: Paz e Terra.
Gliessman, Steve. (2016). Transforming food systems with agroecology.
IBGE. (2017). Censo Agropecuário. Disponível em: https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/censo-agropecuario/censo-agropecuario-2017. Acesso em: 10 mai. 2021.
Minas Gerais (Estado). (2018). Lei Ordinária nº 23.207, de 27 de Dezembro de 2018. Institui o Polo Agroecológico e de Produção Orgânica na região da Zona da Mata. Belo Horizonte, MG, Dez. 2018.
Rodrigues, Gabriel Magalhães. O Pronaf na Zona da Mata Mineira: efeitos nos PIBs total e setorial dos municípios. Revista de Economia e Sociologia Rural, v. 57, n. 1, p. 29-48, 2019.
Wezel, A. et al. (2009). Agroecology as a science, a movement and a practice. A review. Agronomy for Sustainable Development, vol. 29, p. 503–515.